Violências:
Não se pode ler qualquer jornal sem mirar, mesmo que se tente fugir, uma chamada que relate algum ato violento, atroz.
A violência é fruto do dia-a-dia, às vezes, de pessoas que jamais poderíamos esperar. Não admira que cada vez mais se queira o isolamento, tendo ou não pessoas por perto, fecham-se os olhos e finge-se que nada acontece ao redor.
Certa vez, chateado com acontecimento muito pessoal, fui a um bar em que geralmente me escoro para esperar alguém, passar o tempo, nesse dia, fui ver um jogo.
Ao chegar já estava 2x0 para o time do Morumbi, quando ouvi alguns gritos e pedidos de socorro vindos de um ponto de táxi ao lado do bar, de início ignorei, pois havia pessoas do lado de fora que sequer viraram o rosto para o lado donde vinham os gritos. Na insistência desses, resolvi olhar melhor, me levantei e vi dois senhores trocando socos e chutes com uma mulher tentando, inutilmente, separá-los: caíra naquele instante ao ser atingida por um soco. Fui até lá, um tranco e outro depois, alguns garçons me ajudaram e, enfim, a luta terminou. Achei estranha a indiferença de tantos, simplesmente, ignorando o fato.
No último final de semana, novamente num bar, mas este já um barzinho, também estranhei a inatividade de tantos ao verem um freqüentador, de modo abusivo, se dirigir várias vezes à sua companheira, numa dessas cenas, ao chocar-se contra minha infeliz presença, eu o toquei, querendo dizer: não foi nada alemão; razão suficiente para ter sido "apavorado" pelo cidadão. Enquanto me desculpava por nada, lembrava da passividade não só do relato acima, mas também de outros: cenas de trânsito, coletivos, fatos cotidianos, que qualquer um que ande pela cidade, e não se faça de cego, pode presenciar.
Durante esses minutos reflexivos, lamentava profundamente o que ouvia, não por mim apenas, e sim por quem os falava, para outros que ouviam e por mais um ou dois que riam. Esses últimos tão pobres quanto quem falava.
Não violência gera não violência. Penso, respiro e leio poesia. De certo modo, pratico poesia, uma vez que acredito em gestos poéticos – inclusive título de um livro de Rubem Alves sobre Gandhi.
Tive remorso só de pensar em reagir. Com isso descobri algo: sou praticamente incapaz de violência. Espero continuar assim, entretanto, espero também não entrar para o clube do "não tenho nada com isso".
Paz e Bem!
3 comentários:
Essa falta de 'gestos poéticos' é notória, comum e cotidiana. Uma praga. Também já andei escrevendo sobre isso...tá no blog.
Vou atrás desse livro do Rubem Alves.
Parabéns pelo texto, pelo exemplo e pela delicadeza.
Puss,
Apesar do tom de desabafo ser individual, a sua voz é a de muita gente. Acaba virando um desabafo coletivo, uma canção.
Aliás, precisava da sua opinião sobre um lance que tá rolando, depois vc vai entender por quê. Você vai ficar por aqui no feriado?
bjo
Embora compartilhe da prática de gestos poéticos, fui vítima, recentemente, de um ato injustificado de violência física.
Desde então, este texto não sai de minha cabeça. É impressionante como o descontrole emocional permeia a vida das pessoas. Todos nascemos aprendendo a ser belos, cheirosos e bem sucedidos, mas ninguém nos ensina nada sobre auto-controle. Daí o caos da sociedade. Privilegiados são os que aprendem com a poesia.
Parabéns!
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